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15 out 2015

Num instante, tudo muda.

TEXTO RETIRADO DE UM SITE PORTUGUÊS A RESPEITO DO BRASIL.

Tudo o que se escreve sobre o Brasil tende a desatualizar-se a uma velocidade vertiginosa, quase sem aviso, se comparado com a Europa, onde o tempo demora mais a passar.

Em poucos anos, cinquenta milhões de brasileiros passaram da pobreza à sociedade de consumo. As grandes marcas fornecedoras dos supermercados aumentaram os stocks por causa da procura e os próprios supermercados contrataram mais pessoal para conseguir escoar os produtos – sobretudo no nordeste, a região do país historicamente mais afetada pela miséria.

No meio da orgia consumista, chegaram ao país o gourmet e o premium e o gourmet-premium e o premium-gourmet, traduzidos em vinhos de castas com nomes franceses, cervejas importadas com ou sem malte, queijos esburacados da Suiça e presuntos da península ibérica.

As lojas entupiram-se de compradores do primeiro “celular” – e do segundo. Os stands entupiram-se de compradores do primeiro automóvel – e do segundo.

Os aviões, lotados de clientes na sua maioria estreantes, sobrecarregaram os céus, as agências de turismo não tiveram mãos a medir para satisfazer brasileiros em trânsito para Nova Iorque e Miami, para a Disneylândia e a Disneyworld, para a quase europeia Buenos Aires ou para a Europa propriamente dita.

No futebol, os outrora exportadores clubes de futebol passaram a importadores: como o Corinthians, que em 2003 perdera Liedson para o Sporting, de Portugal, mas em 2011 recuperou o mesmo jogador por causa das dificuldades financeiras lusitanas.

Os homens brasileiros descobriram, com décadas de atraso em relação às mulheres, os prazeres e benefícios das operações plásticas, do vestuário mais exigente, das indicações da moda.

No cinema e na publicidade produzir um filme ou um spot com estrelas nacionais tornou-se mais caro do que importando astros americanos porque os cachês brasileiros eram mais elevados.

Mas num instante, tudo muda.

Agora, a aposta das maiores distribuidoras brasileiras passou a ser em filmes e spots nacionais, por culpa da alta do dólar e porque as tais estrelas caíram na real – e juntamente com o real. A Paris Filmes, maior distribuidora independente do Brasil, planeia reduzir para metade a aquisição de produções estrangeiras.

O setor da beleza, mesmo no país onde o corpo é a alma do negócio, onde as mulheres não envelhecem, ficam loiras, e onde os tais homens descobriram o botox, registou a primeira retração nos últimos 23 anos. A brasileira Natura caiu 15% em volume de vendas nacionais do primeiro para o segundo semestres deste ano, a americana Procter & Gamble cortou em 50 por cento as verbas em publicidade no país.

Corinthians e Sporting voltaram a lutar pela contratação de um avançado, o colombiano Téo Gutíerrez, que acabou por recusar o primeiro porque o segundo, à última hora, apresentou proposta mais alta de salário.

As vendas de pacotes de viagens internacionais caíram 10 por cento no segundo semestre de 2015 por comparação com o período homólogo do ano passado. A CVC, principal agência de viagens do país, reduziu em média sete por cento o valor geral dos pacotes desde o início do ano. E o slogan português “vá para fora, cá dentro” ganhou atualidade no Brasil com a subida da cotação das principais moedas internacionais e a diminuição dos preços dos resorts locais, que também caíram na real.

As vendas da indústria automóvel baixaram a pique, os despedimentos no setor sucedem-se. Os segundos telemóveis, por falta de pagamento, tornaram-se ociosos.

Nos supermercados, os caçadores de descontos e promoções são agora 64 por cento contra os 39 de há cinco anos, segundo pesquisa do Instituto Data Popular de Agosto. E hoje, 87 por cento dos brasileiros admite procurar e comparar preços antes de comprar o pão ou o leite.

Já produtos considerados supérfluos, como cerveja, chocolates ou salgados, começam a escassear nas prateleiras por falta de procura – o índice nacional que mede a quantidade do stock em falta em relação ao total de mercadorias da loja atingiu em Julho queda de perto de 13%.

Por culpa da inflação, os brasileiros passaram em 2015 a ir às compras três vezes menos do que no ano passado, registou a consultora Kantar Worldpanel – no nordeste, hoje menos pobre mas ainda a mais pobre região do país, o refluxo foi superior à média nacional.

Neste país muda tudo depressa demais devido à proverbial tendência dos brasileiros para o exagero, na abundância ou na crise, de que é símbolo a sua seleção nacional, antes considerada acima do bem e do mal pela “torcida” e agora vista como execrável. A não ser que o Brasil tenha goleado a Venezuela nesta madrugada e passado a país do futebol outra vez.

Fonte: Dinheiro Vivo (Portugal)