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13 jun 2021

Indústria da moda entra na onda de “upcycling”

Muito antes de o termo “upcycling” entrar para o vocabulário da moda como tendência, o reuso criativo de sobras da indústria já era praticado por algumas grandes marcas. Como a grife francesa Hermès, por exemplo, que em 2010 criou a “Petit h” para aproveitar sobras de couro em bichinhos, pulseiras e pequenos objetos. Hoje, muitas marcas europeias e americanas fazem o mesmo. Diferentemente da reciclagem, no upcycling os descartes que muitas vezes iriam para o lixo, são reaproveitados sem passar por nenhum processo químico. “É o conceito do futuro”, diz a brasileira Fernanda Daudt, que mora em Nova York e abriu a Volta Atelier há quatro anos já de olho no mercado externo.

Fernanda vende bolsas produzidas no Brasil com restos descartados pelo mercado de couro do Rio Grande do Sul. A produção se divide entre Caxias do Sul e São Leopoldo e há ateliês específicos para corte, montagem e costura. Por enquanto, são 12 modelos. As bolsas não são forradas, são leves e utilizam o mínimo possível de metais. Todas as peças são feitas à mão, com sobras, e por mulheres em situação de vulnerabilidade social. “Antes, havia uma certa vergonha de trabalhar com restos, e o objetivo agora é elevar o status da matéria-prima que seria descartada. A diferença é que a estrutura de produção não é ditada por coleções nem pelo modelo, mas em função da matéria-prima disponível.”

A Volta já está presente em mais de 60 lojas, entre Estados Unidos, Porto Rico, México, Japão e Brasil, e também on-line. O investimento foi pequeno, cerca de US$ 20 mil, e as bolsas custam entre US$ 160 e US$ 380.

“O mercado é crescente”, assegura Fernanda, que já trabalhava com moda como consultora: “O descarte é uma falha de design, uma obsolescência programada. O mundo não comporta mais isso. As novas gerações querem consumir de outra maneira. Estamos alinhados com os princípios de desenvolvimento sustentável da ONU.”

A pandemia foi uma oportunidade para Paula Ferber, que está à frente da marca de mesmo nome, olhar para o upcycling. Ela já estava cada vez mais comprometida com materiais orgânicos, sustentáveis, e elementos da brasilidade em sua linha de sapatos, bolsas e objetos para a casa. “Nossa cabeça sempre foi voltada para desenvolver coleções com o novo e há muito preconceito com o que é velho ou está parado. Com a crise que afetou a todos, percebemos que era hora de criar novos verbos, como renascer. Fizemos uma coleção inteira com a matéria-prima nobre que estava parada na fábrica: foi uma maneira de renascer”, conta.

O método de reaproveitamento, segundo Paula, é um processo de produção diferente, que permite economia na matéria-prima e dá mais trabalho no corte e montagem. “Com o fluxo de caixa mais apertado não precisei desembolsar para a produção.” A Paula Ferber atualmente tem 40 pontos de venda no país, um showroom e uma loja em São Paulo. No total vende 20 mil pares de sapatos por ano, cujo preço varia de R$ 650 a R$ 1.200. São 35 funcionários e o sócio da empresa é Reinold Geiger, bilionário austríaco, presidente da L’Occitane en Provence.

Um começo cauteloso, apenas com uma linha de jaquetas feita de velas de barcos usadas, que ficaram anos rodando o mundo, foi o caminho escolhido pela J.A.B. – Just Another Brand, marca masculina fundada em 2017, que reúne egressos da Yacthsman, Ellus e VR. Presente em 450 pontos de venda no país, ela abrirá sua primeira flagship em junho, no bairro dos Jardins, em São Paulo.

Paulo Tavares, um dos sócios, explica que 80% dos itens da J.A.B. são produzidos na Ásia com tecidos novos, mas que as jaquetas são feitas aqui. Há diferentes gramaturas e tamanhos de velas, o que condiciona seu aproveitamento. Das pequenas, dá para fazer apenas uma jaqueta, que custa R$ 970. Já as velas oceânicas, permitem 25, a um custo de R$ 700. A produção nasceu de uma parceria entre a marca e o projeto Revela, que já atuava em Ilhabela (SP) e confeccionava produtos com velas para beneficiar comunidades de baixa renda.

“Temos uma fila de 20 clientes esperando jaquetas. São peças exclusivas, nobres, que carregam uma história. Não esperávamos esse sucesso. Já estamos desenvolvendo protótipos de tênis e testando o material para uma linha de shorts. A dificuldade é conseguir as velas, mas a ideia é fazer uma coleção cada vez maior”, diz Tavares.

 

 

Fonte Valor