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13 maio 2021

“Dress code” do home office traz diversidade ao mundo corporativo

Quatro anos depois de o mundo corporativo discutir se era aceitável usar bermuda no escritório – e o impacto do “dress code” flexível na imagem profissional -, o executivo Alexandre Winandy, diretor de digital e marketing do banco Bmg, defende o traje despojado no home office. “Tínhamos receio que perdêssemos as conquistas da mudança cultural que estávamos fazendo e a liberdade de se vestir era uma delas”, diz Winandy, que trabalha de chinelo, bermuda nos dias de calor e moletom nos dias frios. Cerca de 80% do de seu guarda-roupa, principalmente as camisas brancas e azuis, estão acumulando pó, diz.

Desde o começo da pandemia, o banco vem estimulando uma comunicação via memes para passar a mensagem de que a formalidade da roupa não é sinônimo de produtividade ou de profissionalismo no home office. Também enviou camisetas personalizadas e pôsteres, criou avatares para reuniões virtuais e fundos de telas para ações com clientes. Para Winandy, trabalhar o “dress code” flexível era importante como política há dois anos diante da transformação de um banco de 90 anos. Hoje, é estratégico para criar um “sentimento de pertencimento” e um ambiente inclusivo no home office.

Os brasileiros que puderam trabalhar de casa ao longo do último ano mudaram a forma de se vestir. Uma pesquisa obtida pelo Valor, realizada pela KD Imagem e Marca Pessoal, com 460 profissionais, indica que cerca de um terço continua se arrumando para o trabalho, mas de um jeito mais informal. Um quinto deles só se preocupa com a vestimenta da parte superior do corpo – e isso quando precisam participar de reuniões. Quinze por cento assumiram que trabalham de pijama ou roupa de ficar em casa e apenas 8% se vestem, todos os dias, no home office como se saíssem para trabalhar.

Bernardo Cavour, sócio da Flow, consultoria de recrutamento com foco no C-Level, diz que raras vezes viu executivos usando terno ou gravata no último ano durante reuniões virtuais. “Todos reduziram o grau de formalidade.” Em um primeiro momento da pandemia, avalia, porque havia desafios demais para lidar no ambiente familiar e profissional. Depois, o conforto vingou. Mas há uma terceira razão. “Houve um movimento muito grande de empresas em busca de inovação, transformação digital e cultural. E falar de tudo isso vestindo terno e gravata pode ser um tanto desconexo.” Ele mesmo usou terno pela última vez antes da pandemia e diz que adotou camisa polo com logo da empresa ou a social, mas com a manga dobrada. A bermuda também entrou em seu dia a dia, sentindo-se confortável diante da menor formalidade que passou a ver do outro lado da tela.

A executiva Márcia Tiemi Takakura, diretora jurídica da MetLife Brasil, diz que “nunca mais viu as suas roupas sociais de advogada.” O salto alto anda esquecido no fundo do armário. Ela também aboliu o uso de brincos grandes que enroscam nos fones, as pulseiras que atrapalham a digitação e a maquiagem mais carregada que “não sai bem na tela virtual”. Recentemente, um funcionário de sua equipe a avisou antes de uma reunião que estava de moletom porque São Paulo esfriara e ela disse que tudo bem. Ela também estava com seu look básico: camiseta preta, moletom, meia e chinelo. A advogada, que já não era adepta do terno, disse que a maior formalidade ficou restrita a apresentações específicas, mas que a sua busca por conforto cresceu no último ano.

“As pessoas aproveitaram que estavam mais em casa, começaram a se vestir com mais liberdade: sapatos mais baixos, tênis, chinelo, pantufa, porque pé não aparece na reunião. E uma preocupação focada na vestimenta da parte superior. Muitas confecções estão me pedindo orientações sobre qual tipo de corte funciona no vídeo”, diz Bia Kawasaki, autora do “Dress Code: Impacto da Imagem Pessoal nos Negócios”. A C&A diz que este movimento é uma tendência: a varejista viu a busca por pantufas crescer 2.034%, a de moletons quase 656% e a de pijamas 1.183% em seu e-commerce. As linhas conforto cresceram três dígitos, em média, desde o início da pandemia. As linhas conforto cresceram três dígitos em buscas. “Antes, quando tinha o escritório, as pessoas se vestiam para sair. Uma vez lá, saíam para ir ao refeitório, onde a comida estava pronta. Hoje, é preciso preparar o almoço, lavar a louça, cuidar das tarefas dos filhos. A roupa também vai mudar porque a rotina mudou completamente – e acho que a busca por conforto é um reflexo”, avalia Fernanda Campos, diretora de pessoas e inovação da C&A Brasil.
Na adaptação no home office, ela diz que tem usado mais jeans, camiseta básica e roupa esportiva por conforto, mas também praticidade. “São muitas tarefas para conciliar e não dá para gastar 40 minutos por dia para me arrumar.”

 

Internamente, ela diz que a varejista aboliu o “dress code” desde 2019, em busca de acolher melhor as gerações mais novas – “que não veem a formalidade de se vestir como sinônimo de profissionalismo” – e de fomentar maior diversidade interna, “respeitando a individualidade e entendendo que não é a roupa que vai demonstrar competência”. Na pandemia, ela disse que essa visão foi mantida sem nenhuma orientação específica sobre “dress code” para os 20% dos funcionários no home office. “Tivemos ações de saúde, bem-estar e ergonomia”, diz.
A IBM, que adotou o “dress code” flexível há quatro anos, diz que também não viu necessidade de falar em vestimenta na pandemia e que é incoerente falar de diversidade querendo que todos se vistam igual. “Pessoalmente, acho muito bacana, além de vermos, nas reuniões por vídeo, as pessoas se vestindo como querem, sua casa, filhos, cachorros. Nossa função como empresa é respeitar isso”, diz Christiane Berlinck, vice-presidente de RH da IBM Brasil e América Latina.

A Vivo flexibilizou o “dress code” em 2017, liberando a bermuda no escritório, em busca de gerar maior autonomia de decisão e liberdade para as pessoas serem o que são, diz Niva Ribeiro, vice-presidente de pessoas da empresa. “Nosso intuito é que os colaboradores mantenham em casa a forma adotada para trabalhar aqui [nos últimos anos], com menos regras e mais liberdade, mas respeitando sempre o bom senso.” Na pandemia, a Vivo não enviou orientação para vestimenta, mas quis trabalhar mensagens institucionais, enviando dez opções de fundo de tela para reuniões aos 20 mil funcionários em home office.
Mas a falta de orientação explícita sobre o que vestir no trabalho em casa tem outro lado e deixou muitos profissionais perdidos, defendem as sócias da KD Imagem e Marca Pessoal. “Não vimos RHs falando a esse respeito e até entendo que juridicamente não podem cobrar as pessoas sobre isso, mas muita gente ficou de câmera fechada com receio de qual imagem estava passando”, diz Karla Giacomet. Ela defende que as pessoas interpretam inconscientemente códigos e sinais, o que impacta na forma como veem e interagem. “As empresas falam: venha de forma autêntica, escolha roupas que o representem, mas não dizem se há consequências no jeito como cada um se veste em termos de reputação e objetivos”, diz a sócia Dani Amorim.

Para 88% dos profissionais entrevistados na pesquisa da KD, e que estão em cargos estratégicos, “o profissional que se preocupa com a imagem pessoal tem mais chance de atingir seus objetivos profissionais”. Bia Kawasaki conta que recentemente uma médica a procurou porque se sentiu desconfortável durante uma reunião virtual em uma multinacional, quando o presidente a elogiou e ela precisou abrir a câmera. “Ela não estava arrumada, apareceu e ficou sem graça. Depois quis trabalhar comigo o óculos e o corte de roupas que precisaria ter para situações como esta.”

Na visão de Winandy, do Bmg, não adianta ter uma política de “dress code” informal se a “diretoria é toda engravatada”. Mais do que falar para as pessoas que elas podem se vestir como quiserem, é preciso que a liderança mostre que está tudo bem trabalhar de moletom ou de terno. Adriana Karam, presidente do Grupo Educacional Opet, também acredita que é a liderança que alinha a vestimenta, no home office ou escritório. “É quem dá o tom e referência. No começo da pandemia, eu vi que fui exemplo porque estava me arrumando para as reuniões virtuais, embora o salto alto eu tenha deixado de usar em casa.”

 

Fonte : Por Barbara Bigarelli Valor