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14 dez 2008

Crise? Não no comércio popular, afirma o Estadão

Domingo, 14 de Dezembro de 2008 | Versão Impressa O Estado de S. Paulo




Crise? Não no comércio popular


O Brás, maior centro de compras da América Latina, é o termômetro das vendas aquecidas antes do Natal



Paula Pacheco


A recepção do vendedor é o sinal de como anda o clima no bairro do Brás, no centro de São Paulo, um dos maiores centros de comércio popular da América Latina. Ao avistar algum potencial cliente, o rapaz anuncia, animado: “Chegou ao lugar certo. O patrão mandou baixar o preço”. Mais alguns passos e é possível verificar que o Brás, termômetro nacional do consumo das classes C, D e E, mostra que a crise passou bem longe do bairro.

Quinta-feira, por volta de meio-dia, e o Lojão do Brás, uma das maiores redes da região, mal tinha espaço para mais visitantes. Famílias, amigas, gente de todo tipo, eram acotoveladas e desforravam o desconforto com empurrões. Vale tudo na hora de pegar o produto mais em conta. De tempos em tempos funcionários uniformizados se aproximavam da multidão com fardos sobre a cabeça. Entra em ação o locutor que anuncia a promoção de toalhas. Em segundos os pacotes com as mercadorias são derrubados no chão e se forma uma roda em torno das promoções. É um salve-se-quem-puder. “Crise? Que crise? Aqui não tem nada disso”, diz uma mulher enquanto tenta pegar uma das últimas toalhas.

O rodoviário Elias Alves Ferreira levou ao Brás a mulher Rejane, uma dos sete filhos e o sogro para as compras de Natal. As sacolas estavam cheias de roupa nova para toda a família. A conta foi de R$ 330,13, mas ainda faltavam comprar os sapatos que, pelo cálculo de Ferreira, custariam outros R$ 400. “Meu ano foi ótimo. Consegui fazer mais crediário, pude pela primeira vez comprar um carro novo”, conta, com a carteira na mão recheada de cartões de crédito. Gastador assumido, Elias deixa com a mulher a missão de controlar as finanças de casa. A renda mensal é de cerca de R$ 1,5 mil. Apesar da quantidade de contas parceladas para pagar, Ferreira se diz confiante. “Dá um certo medo de os juros subirem demais, por isso deixei para depois o plano de financiar uma casa própria”, diz.

Nem a demissão no fim de novembro acabou com o ânimo do ferramenteiro Rodney Olah. Recém-casado e à espera do primeiro filho, Olah trabalhava em uma empresa que prestava serviço para montadoras como Volkswagen e GM. Com o dinheiro da rescisão de contrato, antecipou o pagamento de algumas dívidas e correu para o Brás com a mulher Rosana Degmon para completar o enxoval de Pamela, que nasce em março. A expectativa era gastar em torno de R$ 500. “Tenho certeza que em no máximo dois meses conseguirei uma outra vaga. O desemprego não me preocupa”, garante.

Entre os camelôs, que tradicionalmente reclamam das vendas, estejam elas boas ou ruins, nem mesmo as ruas abarrotadas do Brás são motivo de animação. Um deles se queixa: “O movimento está fraco, muito fraco”. Para melhorar as vendas, vale muito gogó e promoções.

Nas barracas enfileiradas, perto do Largo da Concórdia, ponto central do Brás, o visitante encontra todo tipo de mercadoria relacionada a confecção e acessórios de moda. Quem não tem barraca improvisa. Faz dos ombros e dos braços um cabide de cintos.

Num dia de sol a pino, quem faz a festa são os vendedores de bebidas e de sorvete. Mas há os produtos tradicionais, como os óculos da “Gucci” e camiseta “Diesel”, tudo a R$ 10. Eles podem até se dizer frustrados com os negócios, mas ninguém abre mão do seu metro quadrado para procurar outra área da cidade. Afinal, esta é a melhor época do ano.