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10 abr 2017

Crise atrai gestora especializada em vender estoques e máquinas

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Os estoques encalhados no varejo e o maquinário parado em indústrias em meio à crise atraíram para o país um tipo diferente de empresa de assessoria financeira. São gestoras internacionais especializadas em liquidar esses ativos – ou “monetizar”, como elas preferem dizer -, adquirindo os produtos por uma fração do preço de custo para vendê-los com lucro depois.

Esse tipo de operação ainda enfrenta resistência entre as empresas nacionais. As preocupações vão desde a perda contábil de se desfazer dos ativos por um valor inferior ao registrado no balanço até uma possível depreciação da marca. Mas para muitas companhias em dificuldade, a venda do estoque ou do maquinário, ainda que não seja lucrativa, pode ser uma forma mais barata e rápida de levantar caixa – e muitas vezes a única.

Dois grandes grupos especializados em monetizar ativos desembarcaram no país ao longo do ano passado: as americanas Gordon Brothers e Hilco. Outras empresas, especializadas em alguns tipos de mercadorias, como equipamentos médicos, também avaliam o mercado brasileiro.

O momento não poderia ser mais propício. A profunda e prolongada recessão levou a um acúmulo tanto nas mercadorias paradas nas lojas como nos equipamentos ociosos nas indústrias. Sem vendas e com alto endividamento, a saída de muitas companhias foi a recuperação judicial. Foram 1.863 pedidos apenas no ano passado, número recorde, segundo a Serasa Experian.

No caso do varejo, além de não render nada, o estoque parado ainda gera custos financeiros elevados relativos às linhas de crédito de capital de giro usadas para a aquisição dos produtos. A tendência é o varejista conceder descontos cada vez maiores para se livrar dos produtos, mas em muitos casos nem mesmo as promoções mais agressivas têm dado resultado.

 Em muitos casos, os lojistas acabam arcando com o custo de mercadorias que já não valem mais nada”, diz Paulo Pires, diretor da TCP Latam, empresa que atua na assessoria de renegociação de dívidas. Ele compara a situação à de uma pessoa que guarda uma roupa que deixa de servir no armário, na esperança de voltar a usá-la algum dia mesmo sabendo que as chances são remotas.

 Com o alto custo do dinheiro no país, a estimativa é que os juros pagos nas linhas de capital de giro consumam todo o valor do estoque em um prazo de 12 meses, segundo Pires. “A venda dessa mercadoria pode representar uma linha de crédito para reduzir um prejuízo que a empresa já teve”, diz. A operação também interessa aos bancos, que já estão com balanços repletos de bens tomados em garantia de financiamentos não pagos.

Por questões de confidencialidade, as empresas não revelam o nome dos clientes com as quais operam. O alvo, porém, são companhias com pelo menos R$ 100 milhões em faturamento ou que contem com um parque de equipamentos que justifique a operação do ponto de vista econômico.

Atraída pela oportunidade que se abriu no mercado brasileiro no contexto da crise, a Gordon Brothers instalou um escritório local no segundo semestre do ano passado. Mas os planos para o país são de longo prazo, segundo Marcos Brandt, diretor do escritório local. Fundada há mais de um século como uma joalheria que fechou as portas e fez uma liquidação para vender seus estoques, a empresa começou a ser contratada para fazer um trabalho semelhante em outras companhias.

No mercado americano, onde os varejistas operam com estoques maiores em razão das baixas taxas de juros, o serviço de liquidação dos estoques é contratado por empresas de todos os portes, e não apenas aquelas em aperto financeiro. “Nos especializamos em comercializar aqueles produtos que o lojista não consegue vender”, diz. No Brasil, a Gordon Brothers está em fase de “catequização” dos potenciais clientes, com o objetivo de explicar o trabalho da companhia, segundo Brandt.

No processo, a empresa que atua na monetização dos ativos garante ao lojista um retorno mínimo equivalente a um percentual do preço de custo dos produtos. Para isso, oferece uma carta de fiança de um banco de primeira linha – no caso da Gordon Brothers, do Bank of America – que pode ser executada caso as vendas não alcancem o valor estipulado. O que superar esse patamar, após os custos e a comissão cobrada pela empresa, é dividido entre as duas partes.

A venda das peças é feita na própria loja, durante um prazo que costuma durar entre 60 e 90 dias, com todas as despesas bancadas pela consultoria. “Liquidar os estoques pode ser uma forma rápida de obter caixa e ainda reduzir custos fixos”, afirma Thomas Felsberg, presidente da Hilco no Brasil.

Além das mercadorias encalhadas no varejo, outra fonte de negócios para as consultorias que operam com a monetização de ativos é o maquinário parado nas indústrias. Empresas de setores como o de construção civil, que vêm sofrendo com o endividamento elevado e a abrupta queda no valor dos imóveis, estão entre os que potencialmente possuem bens que podem ser comercializados.

 No caso das indústrias, o processo funciona de maneira diferente. A empresa que vende o ativo pode tanto garantir um valor mínimo e dividir o resultado excedente após a negociação ou receber pela máquina imediatamente. Como não há demanda no país para esses equipamentos, ainda mais em um momento de crise como o atual, a revenda do equipamento em geral ocorre fora do país.

O valor obtido pela empresa que vende a máquina costuma ser bem inferior ao de aquisição. Isso ocorre porque esses ativos já são negociados a preços bem inferiores no exterior, onde os impostos são menores, segundo Felsberg. “A tributação, a depreciação do bem e os custos afetam o preço que eu posso pagar”, diz. Ele afirma, contudo, que a conta passa a fazer sentido quando se inclui, além do valor recebido, os custos de manutenção da máquina e do uso dos recursos para reduzir o peso do endividamento bancário.

Fonte:http://www.valor.com.br/financas/4932484/crise-atrai-gestora-especializada-em-vender-estoques-e-maquinas